Especial — moon e os moonies
Observando
o panorama do Brasil, pode-se parafrasear o apóstolo Paulo: “Senhores
brasileiros! Em tudo vos vejo acentuadamente religiosos” (At 7.22). Diversos
fatores que não vem ao caso relatar contribuem para que nosso país seja terreno
fértil para todo tipo de pregação religiosa.
Entre tantas religiões, seitas e crenças que proliferam no Brasil, existe a
Associação do Espírito Santo para a Unificação do Cristianismo Mundial, mais
conhecida como Igreja da Unificação. Recentemente, tem sido chamada Federação
de Famílias para a Unificação e Paz Mundial. Seus adeptos são conhecidos
popularmente como moonies, devido a Sun Myung Moon,
seu fundador.
A seita(1) vem adquirindo seguidores e propriedades no Brasil(2). Tem projetos
ambiciosos e sonhos ousados.
Sun Myung Moon — o brilhante
dragão da sedução(3)
Yong Myung Moon, cujos pais eram membros de uma igreja presbiteriana, nasceu em
6 de janeiro de 1920 numa aldeia hoje pertencente à Coréia do Norte. Yong
significa dragão e Myung, brilhante.
Com 26 anos, mudou seu nome para Sun Myung Moon (Sol e Lua Brilhantes). Ele diz que na manhã de Páscoa
de 1936, Jesus lhe apareceu em visão, comissionando-o para completar a missão
que iniciara 2000 anos antes. Havia em alguns círculos pentecostais da época
predições sobre um novo messias, que seria coreano. Durante a Segunda Guerra
Mundial, Moon estudou engenharia elétrica na Universidade Waseda, em Tóquio,
mas não se sabe se concluiu o curso. Entre 1946 e 1950, passou um tempo preso.
Ele diz que foi por sua atividade anticomunista. Mas há quem afirme que sua
prisão foi devido à bigamia. É sugestivo que só ele tenha assumido postura
anticomunista em 1962. Não são claras também as circunstâncias de sua
libertação da prisão. Em 1948, foi cortado da comunhão da Igreja Presbiteriana.
É sugestivo ainda que seu nome signifique dragão. Lembra 2 Coríntios 11.14 e
Apocalipse 12.9.
Em 1954, Moon fundou a Igreja da Unificação. No ano seguinte, passou 3 meses
preso em Seul, acusado de adultério e promiscuidade. Em 1957, publicou Princípio
divino. Na verdade, essa obra foi escrita por um discípulo de Moon
chamado Hye Won Yoo, que morreu por volta de 1970. No mesmo ano em que fundou a
Igreja da Unificação, Moon desfez um casamento de 10 anos, dizendo que sua
esposa não podia compreender sua missão. Sua vida familiar é confusa. Casou-se
umas quatro vezes e tem treze filhos desses casamentos. Isso é estranho para
quem tem o casamento como o centro de seu ensino. Ele e a esposa, Hak Ja Han,
mãe de oito de seus filhos, são chamados Verdadeiro pai e Verdadeira mãe pelosmoonies. Alguns de seus filhos são usuários de drogas.
Não há muito tempo, algumas de suas filhas e noras falaram muito mal dele no programa
CBS 60 Minutes, da televisão norte-americana.
Moon é dono de um império, com propriedades na Coréia do Sul, Estados Unidos,
Uruguai, Japão e Brasil, perfazendo patrimônio estimado em 8 bilhões de
dólares(4). No entanto, algumas de suas empresas na Coréia foram fechadas. De
fato, lá a figura do brilhante dragão da sedução é menos respeitada que no
resto do mundo e o número de moonies tem diminuído, apesar de o movimento
ter se iniciado nesse país.
Estranhos ensinos
Urbano Zilles classifica a IU como religião sapiencial(5). Para o
estudioso, o fenômeno da religião sapiencial é típico do Oriente. Enquadram-se
nesta categoria também o budismo, o taoísmo e o confucionismo. Essa religião
baseia-se na sabedoria humana e na experiência de vida. Mostra um caminho a
seguir, com ênfase no autoconhecimento. As crenças da IU podem ser assim
resumidas(6): 1) o Princípio divino é revelação complementar à Bíblia e
superior a ela; 2) a teologia moonie é sexocentralizada: tudo é visto em
termos de masculino e feminino. Por exemplo, Deus, “sujeito masculino interno”,
criou o universo como “objeto feminino interno”. É oportuno lembrar os vários
casamentos de Moon e os inúmeros problemas que enfrentou por seus
relacionamentos adulterinos; 3) há três figuras principais na história: o
primeiro Adão (na criação), o segundo Adão (Jesus) e o Senhor do Segundo
Advento (nos últimos dias). Este, conforme oPrincípio
divino, foi profetizado que nasceria no Oriente, 2.000 anos depois
de Jesus. É curioso que oPrincípio
divino não afirme que
o Senhor do Segundo Advento seja Moon. Os moonies dizem que cada convertido
decidirá por si só quanto à identidade do Senhor do Segundo Advento; 4) a queda
do homem é interpretada em termos de pecado sexual; 5) Jesus é visto como
imperfeito, pois jamais se casou. Aliás, o casamento é o único “sacramento” da
IU; 6) há constantes contatos com espíritos. A igreja é, na prática, espírita.
A crença moonie é fortemente influenciada pelo
xamanismo, a crença primitiva da Coréia, que crê em espíritos bons e espíritos
maus que conduzem os acontecimentos diários do mundo físico(7); 7) osmoonies crêem que a história é uma luta entre
Deus e Satanás, ou entre Abel (filho de Eva e Adão) e Caim (conforme a teologia
da IU, filho de Eva e Satanás). Deus e Abel seriam representados pelas nações
democráticas e ocidentais. Satanás e Caim teriam como representantes as nações
totalitárias materialistas(8).
O que leva alguém a entrar em
um movimento como este?
Quem crê na autoridade das Escrituras Sagradas como revelação de Deus não
tem dificuldade em refutar os ensinos do dragão brilhante, veiculados pela IU.
Afinal, são distorções bíblicas que podem facilmente ser rechaçadas por quem
tem conhecimento, ainda que pequeno, da Palavra de Deus.
O problema em questão é: como entender que alguém entre em um movimento com
ensinos tão estranhos?
Walter Martin, especialista em Apologética, lembrava que “o sistema doutrinário
das seitas se caracteriza por um fechamento da mente. Eles não buscam uma
avaliação cognitiva racional dos fatos”(9). A IU se enquadra na descrição feita
por Martin. Há também o processo de lavagem cerebral, ao qual são submetidas as
vítimas incautas das seitas. Por meio de forte condicionamento psicológico, as
vítimas são levadas a aceitar sem questionamentos os incoerentes ensinos das
seitas. É oportuno lembrar que, em setembro de 1980, a TVS do Rio de Janeiro
veiculou reportagem sobre processo que a IU sofria por aliciamento de um menor
de Vitória, ES, acontecido em julho de 1979 no bairro carioca do Grajaú.
As seitas em geral têm vida comunitária muito mais intensa que as denominações
tradicionais. Isso prende as vítimas de grupos sectários como a IU em uma teia
da qual é difícil sair. Mas graças a Deus não é impossível(10).
Os desafios da Igreja da
Unificação ao cristianismo ortodoxo
Um dos mais importantes desafios é o do cuidado pastoral para com toda a
comunidade. Muitas pessoas caem nas armadilhas de seitas como a IU porque se
sentem parte de uma família no grupo sectário e herético. Esse sentimento de
família nem sempre está presente na igreja que professa uma fé ortodoxa. O
fator comunitário da vivência da fé é tão importante, que dificilmente será exagerado.
Geralmente, em igrejas que professam a fé sem desvios heréticos, quando se fala
em uma seita, só se considera o aspecto racional das deturpadas doutrinas por
ela ensinadas. É bem verdade que a questão doutrinária é importante, não
podendo ser desconsiderada. Há que se ensinar corretamente a doutrina bíblica
aos membros das igrejas. Crentes doutrinados não serão vítimas fáceis de
ensinos deturpados. Porém, ao mesmo tempo há que se fortalecer a vida
comunitária dos crentes, para que não se encontrem em posição de cair
facilmente em armadilhas, como a Igreja da Unificação do dragão brilhante da
sedução.
Carlos R. Caldas Filho, doutorando em ciências da religião e professor no
Seminário Presbiteriano do Sul, em Campinas, SP, e no Centro Evangélico de
Missões, em Viçosa, MG, é pastor da Igreja Presbiteriana do Brasil.
Notas:
1. A palavra seita é usada na Sociologia da Religião e na
Apologética Teológica. A primeira fala de seita em contraste com denominação.
Enquanto a denominação se entende como um grupo entre muitos, a seita se
entende como a única detentora da verdade. A segunda usa o termo a partir do
critério da ortodoxia teológica: seita é o grupo heterodoxo, isto é, que
apresenta uma deturpação do ensino aceito pela cristandade (= ecumene).
A IU é seita nos dois sentidos.
2. A Agência Estado noticiou
em 13 de setembro de 1999 que o Rev. Moon é dono de 35 propriedades na região
de Campo Grande, MS. A compra da Fazenda Figueira, em Jardim, gerou protestos
da parte de integrantes do Movimento dos Sem Terra (MST), que reivindicavam a
área para reforma agrária.
3. A maior parte das informações sobre a vida de Moon é retirada de The Moon
Doctrine, de J. Isamu Yamamoto (Downers Grove: Intervarsity Press,
1976). Outras informações são de Helen Cho, filha do Dr. David Cho (presidente
da Associação de Missões do Terceiro Mundo), residente em Seul.
4. A nova Coréia floresce no Pantanal. Veja. 3 fev. 1999.
5. Religiões, crenças e crendices. Porto Alegre: EDIPUCRS,
1998.
6. Mais detalhes quanto aos ensinos da IU aparecem no muito bem documentado “Eu
sou seu cérebro”. Sun Myung Moon. A
sedução da Igreja da Unificação, de C. Timóteo Carriker (Campinas:
Edição do autor, 1982. pp. 79-106).
7. Id. p. 103.
8. LEITE FILHO, Tácito da Gama. Seitas orientais. Seitas do nosso tempo.
3. ed. Rio de Janeiro: JUERP, 1990. Vol. 2. p. 32.
9. O império das seitas. Venda Nova: Betânia, 1992. Vol.
3. p. 25.
10. Eu sou seu cérebro (pp.
143-153) apresenta o testemunho de Valda Silveira, ex-adepta da IU.
especial — a nova jerusalém do reverendo moon
Antes de seguir para Dourados (veja O
Mineiro com Cara de Matuto na Missão Evangélica Caiuá), fiz
questão de visitar a pequena cidade de Jardim, a 273 quilômetros de Campo
Grande. Hospedei-me com o médico Rafael Donha Sanches Neto, que me levou a
conhecer o Recanto Ecológico Rio da Prata. Percorri uma trilha de cerca de 5
quilômetros em plena mata à margem do rio da Prata, que nasce e corre naquela
imensa fazenda de gado. É tudo absolutamente natural. Não se pode levar nada
para comer nem falar alto. A volta se faz através da correnteza do rio,
flutuando de bruços com a cabeça dentro d’água para enxergar o leito e os
enormes e coloridos peixes que nadam ao lado ou abaixo do visitante.
Encontrei-me, à noite, com o major Élcio Galícia, comandante da 4ª Companhia de
Engenharia de Combate Mecanizada. O militar é um estudioso da história do
Brasil e contou alguma coisa sobre a famosa Retirada da Laguna, que lembra a
marcha de 1.680 soldados brasileiros de volta ao país depois de repelidos pelas
forças paraguaias, na época da Guerra do Paraguai, em 1867. Um dos poucos
sobreviventes, Alfredo d’Escragnolle Taunay, de 24 anos, escreveu 4 anos
depois, o documentário A Retirada da Laguna (1871). A Guerra do Paraguai durou 5
anos, matou 300 mil pessoas e deixou um homem para cada 28 mulheres no
Paraguai. No dia seguinte visitei o abandonado Cemitério dos Heróis, onde estão
sepultados muitos dos mortos da Retirada. Alguns deles morreram de fome, vendo
do outro lado do pequeno rio um sítio cheio de árvores frutíferas — não havia
como atravessar o rio.
Mas o meu principal objetivo em Jardim era visitar a Fazenda Nova Esperança,
onde o norte-coreano Sun Myung Moon, mais conhecido como Dr. Moon ou Rev. Moon,
está construindo a sua Nova Jerusalém.
O tamanho da obra que está sendo empreendida é de deixar qualquer um atordoado.
A fazenda tem 300 hectares e os diferentes prédios em fase de acabamento ocupam
20 mil metros quadrados. Além disso, Moon está comprando dezenas de outras
fazendas na região. Ele e seus seguidores estão convencidos de que o lugar foi
providenciado por Deus para se estabelecer ali a “Nação de Deus”. Os argumentos
em favor desta tese são os mais estranhos possíveis. Só porque a propriedade
fica num município chamado Jardim, eles relacionam essa coincidência com o
jardim do Éden, a primeira residência do homem... Só porque a fazenda situa-se
entre dois rios (Prata e Miranda), outra vez o jardim do Éden é lembrado, já
que ele também era cortado por dois rios (Tigre e Eufrates)... Só porque a
cidade de Jardim encontra-se no Mato Grosso do Sul e não no outro Mato Grosso é
razão suficiente para se construir naquele Estado a Nova Jerusalém, pois o Sul
sempre foi menos rebelde a Deus... Basta lembrar Israel depois da divisão do
país em duas nações, o Reino do Norte (mais idólatra) e o Reino do Sul (menos
ímpio)... Basta lembrar a Coréia do Norte e o Vietnã do Norte, ambos
comunistas, e a Coréia do Sul e o Vietnã do Sul, ambos democratas... Segundo a
seita, Deus perdeu a América do Norte porque os Estados Unidos fizeram grande
oposição a Moon. Então, agora, chegou a vez da América do Sul... A Coréia do
Sul é a Jerusalém do hemisfério norte e o Brasil é a Jerusalém do hemisfério
sul.
Outro fato que me deixou apavorado é o modo como Moon é tratado. Ele e a mulher
(Hak Ja Han Moon) se auto-apresentam como os Verdadeiros Pais e por esse nome são chamados. Um de
seus seguidores e ministros é o coreano Chang Seong Ahn, formado em direito na
Universidade de Seul. Ele ensina os fiéis “a inclinar-se, durante o dia e à
noite, diante dos Verdadeiros Pais” e afirma que Jesus fez o mesmo. Chang não
tem o menor acanhamento em declarar que Jesus não é mais a figura central. A figura
central agora é Moon e mais ninguém: “Nosso Pai (referindo-se a Moon)
representa o Pai Celestial, Deus”. No futuro, acrescenta, “os Verdadeiros Pais
tornar-se-ão os Reis dos reis em todo o mundo”, já que “Jesus deveria ter
realizado essa missão, mas não o fez”.
Todas essas estultícias podem ser lidas em Mundo Unificado, a revista da
Associação das Famílias para a Unificação e a Paz Mundial. Ali na fazenda Nova
Esperança, comprei dois números da revista e os livrosPrincípio divino, A
família abençoada e o reino ideal e A
realidade do mundo espiritual e a vida na terra. Este último,
escrito por outro coreano, Sang Hun Lee — que deixou a medicina para dedicar-se
à Igreja da Unificação (a seita de Moon) —, contém uma série de propalados
encontros que o autor teve com personagens bíblicos (Maria, Jesus, Judas etc.),
religiosos (Buda, Confúcio, Maomé etc.) e políticos (Karl Marx, Lenin, Stalin,
Hitler, Mussolini, Tojo etc.) naquela esfera que ele chama de “mundo
espiritual”.
Passei a manhã inteira na Fazenda Nova Esperança. Vi o enorme templo cheio de
orientais, especialmente coreanos e japoneses, que vieram ao Brasil para
estudar a doutrina da Igreja da Unificação, cujo nome oficial é Associação do
Espírito Santo para a Unificação do Cristianismo Mundial. Conversei livre e
amigavelmente com membros desta seita herética surgida na Coréia do Sul há 45
anos. Conheci um tal de doutor César, que é o representante legal da Fazenda e
encontrei-me com Kim Yoon Sung, mais conhecido como presidente Kim, por ser o
presidente do Projeto New Hope. Esse Kim, de 60 anos, tem dois doutorados, em
administração e agronomia. Ele tem certeza de que Moon é “o messias anunciado
pelo apocalipse bíblico”. O projeto está orçado em 2 bilhões de dólares,
envolve 33 cidades do Mato Grosso do Sul, pretende construir um aeroporto
internacional com pistas de 4 quilômetros e espera criar naquela área “a mais
bela, rica e produtiva região do mundo”. O grande problema do “presidente Kim”
não é dinheiro, mas a má vontade dos mato-grossenses do sul de vender suas
terras. Moon, de 79 anos, e sua atual esposa não estavam na fazenda. Ele tem
treze filhos e viaja pelo mundo inteiro.
O missionário brasileiro no Uruguai, José Arlindo dos Santos, informou que a
seita Moon possui naquele país um hotel de cinco estrelas, uma gráfica, dois
jornais, um banco com várias agências, além de muitos projetos em andamento,
que incluem a construção de um estaleiro, a compra da sede da Embaixada da
Argentina em Montevidéu e a doação de 200 mil dólares à Comissão Honorária de
Luta contra o Câncer. Essas informações, Arlindo encontrou no livro Cristo o
Moon (Cristo ou
Moon), que já está sendo traduzido para o português, do pastor e jornalista
uruguaio Guillermo Medován.
Uma coisa é certa: a Nova Jerusalém que Moon está levantando em Jardim deverá
enriquecer mais ainda o Mato Grosso do Sul e propiciar muitos empregos, além de
exercer uma influência em todo o Mercosul, já que a cidade está mais ou menos a
2 horas de vôo de centros como São Paulo, Brasília, Montevidéu, Buenos Aires e
La Paz. Sob o ponto de vista religioso, o megaprojet.
FONTE REV.ULTIMATO
Nenhum comentário:
Postar um comentário